Coreografias sintropicas- práticas de atenção com o ambiente

Bianca Scliar

Palavras-chave: escultura social, práticas de atenção, coreografias sintropicas, pedagogia da percepção, ecoperformance


PT

“Tomar ação em devoção ao futuro” (Beuys, 1990, p.93) é um dos clamores deixados por Joseph Beuys através de suas práticas de escultura social , que desenvolveu por três décadas no contexto da Alemanha no pós guerra. A atuação de Beuys alcançou campos que, embora sao indissociáveis para as artes e incluem o ativismo político, a responsabilidade ecológica, a concepção de educação livre e inclusiva para os sentidos e sentires do corpo, que integra elementos da natureza, a habilidade em fabular e compor coletivamente através da prática escultorica que desenvolveu desde seu encontro com o xamanismo sibério. A partir deste legado nosso trabalho, desenvolvido na ilha de Santa Catarina, cinquenta anos após sua proposição da arte como escultura social, formulamos no Laboratório de Ensaios e Imprevistos proposições para uma pedagogia da percepção, a saber, práticas de educação dos sentidos na performance e artes da presença.

Nesta comunicação abordamos as proposições pedagógicas realizadas no Seminário de Eco-performance, que teve como objetivo o estudo sobre práticas de atenção e congregação com o ambiente. Como resultado do encontro entre jovens pesquisadores da área da geografia, psicologia, educação física, antropologia e artes cênicas, reunidos em sala de aula e em caminhadas, visitas a sítios arqueológicos e à aldeia Mbya-Guarani, no município de Biguaçu, surgiu o conceito de coreografias sintropicas, em que destacamos a relevância em produzir a especulação comum desde o corpo em movimento e o cultivo da consciência integrativa, que sugere um desvio para a bifurcação da natureza (Whitehead, 1938), predominante nos modelos de educação ocidentais. Notamos que, apesar do emprego de uma crítica oriunda da virada vegetal e do contexto teórico das humanidades no antropoceno, permanece, nas práticas de treinamento, a reiteração de noções humanistas nas artes da presença, a saber: repetição de refrões de genialidade e autoria, a instrumentalização dos sentidos e a persistente capitalização de habilidades corporais. Como resultado o corpo permanece compreendido dentro dos limites de uma individualidade debilitante, sendo a integração do mais-que-humano (Manning;Massumi, 2014), ainda um desafio para os processos pedagógicos atualmente instaurados.

Evocamos Beuys para alcançar proposições criativas e encontrar simultaneamente um comum ( Bordeleau, 2022) e um organismo em devir, treinar o corpo-que-excede e 'atravessar as paredes' (Abramovic, 2020). Relembramos as concepções da escultura social para treinar e praticar corpo e ambiente, ativando o 'organismo que se personifica' para finalmente sugerir uma pedagogia da percepção atual que ativa a vitalidade para além da senciência (Arakawa e Gins, 2002). Como tornar o corpo-em-relação o eixo central na virada ecológica, desde a concepção de nossas percepções até a prática de educação do movimento é uma das perguntas que moveu esta pesquisa. Com apoio da filosofia processual pensamos a performance coletiva desde uma gama indeterminada de correlações como calor, umidade, tônus, consciência integrativa, clima, para ativar o que Manning chama de ‘movimento pré-acelerado’. Compartilhamos aqui proposições teórico-práticas para corpos sintrópicos em treino e criação.



Referências

  • ABRAMOVIC, Marina. (2017). Pelas paredes: Memórias de Marina Abramovic. São Paulo, José Olímpio.
  • ARAKAWA; GINS, Madalaine.(2002) Arquitectural body. Tuscaloosa e Londres. The University of Alabama Press.
  • BRIAN, Sophie; MULLER, Regina; PELBART, Peter. (1990) Terra comunal: Marina Abramovic + MAI. São Paulo, SESC Edições. BEUYS, Joseph. Joseph Beuys in America- Energy Plan for the Western Man. Nova Iorque, Four Walls Eight Windows.
  • MANNING, Erin. Políticas do Toque.(2023) Movimento, Soberania, Sensação. São Paulo, GLAC.
  • MANNING, Erin; MASSUMI, Brian/ (2014)Thought in the Act. Pedagogies in the Ecologies of Experience. Minneapolis, University of Minnesota Press.
  • SCLIAR, Bianca; LAGO, Victor Hugo. (2022). O desenvolvimento dos trabalhos em Esquisosomáticas. 30. Seminário de Iniciação Científica UDESC. SCLIAR, Bianca; Rover, Alice. Planos de Cura em A Manga Perfeita. Esquisosomáticas em movimento. 31. Seminário de Iniciação Científica UDESC.
  • WHITEHEAD, Alfred, North. (1938). Modes of Thought. Nova Iorque, the Free Press.
  • _______. (1933). Adventures of Ideas. Nova Iorque, The Free Press.


Bio


EN

Bianca Scliar is a multimedia artist, translator and teacher who works at the intersections between dance and visual arts. Professor at the Arts Center at UDESC, her works dialogue with traditional knowledge, especially in the relationships between healing, the environment and pedagogies of perception. PhD in Arts and Philosophy from Concordia University (Montreal/Canada) and Master in Public Art and Contemporary Strategies from Bauhaus Universität, (Weimar/Germany), her main areas of activity are relational arts, social sculpture and dance as an ecology of practices. On the island of Santa Catarina, she runs Lab.Ei, a Testing and Unexpected Laboratory, an interdisciplinary research-creation center. She is a researcher associated with the 3Ecologies Institute in Montreal, where she carried out her post-doctoral research in 2023 on Pedagogies for Forests - Movement and plant consciousness.


PT

Bianca Scliar é artista multimídia, tradutora e professora e trabalha nas intersecções entre a dança e as artes visuais. Professora no centro de Artes da UDESC, seus trabalhos dialogam com os saberes tradicionais, especialmente nas relações entre cura, meio ambiente e as pedagogias da percepção. Doutora em Artes e Filosofia pela Concordia University (Montreal/Canadá) e Mestre em Arte Pública e estratégias Contemporâneas pela Bauhaus Universität, (Weimar/Alemanha), suas principais áreas de atuação são as artes relacionais, a escultura social e a dança como ecologia de práticas. Na ilha de Santa Catarina dirige o Lab.Ei, laboratório de Ensaios e Imprevistos, núcleo de pesquisa-criação interdisciplinar. É pesquisadora associada ao 3Ecologies Institute em Montreal, onde realizou em 2023 sua pesquisa de pós-doutorado Pedagogias para Florestas- Movimento e consciência vegetal.


GO BACK


^