Palavras-chave: Congo, Trauma, Arte, Imagem Dialética, Reparação
Esta proposta de comunicação é um desdobramento de meu doutoramento em curso. Em minha pesquisa, reflito sobre as ressonâncias entre a reparação do traumático e as criações de artistas emigrantes da República Democrática do Congo. Entrevistando artistas congoleses no Brasil e em Québec (Canadá), discuto a relação entre a visibilidade de suas criações e o fomento de discussões concernentes às migrações involuntárias e aos traumas coletivos de seu país. No vértice desta discussão, reflito sobre o papel da obra de arte na reparação dos traumas infligidos à população congolesa pela Bélgica, país que nos séculos 19 e 20 instalou um violento sistema de exploração humana e extração de bens naturais e culturais da nação centro-africana (Van Reybrouck, 2015). No centro desta comunicação, proponho discutir alguns movimentos realizados no Museu Real da África Central, localizado em Tervuren (Bélgica), cujo acervo de obras congolesas é o maior fora do Congo. Nos últimos anos, este museu passou por um processo de alteração de imagens e narrativas como modo de transformar seu estatuto simbólico de “um lugar de memória das conquistas belgas” para um, ainda tímido, espaço de reflexão ética sobre o colonialismo. Reconheço nesse gesto de reposicionamento ético-político uma movimentação dialética relevante, pois na medida em que novas combinações de textualidades e imagens evidenciam contradições e revelam camadas recalcadas da história dos vencedores, ou em termos propriamente benjaminianos: escovam a história à contrapelo (Benjamin, 1987; Didi-Huberman, 2010), bens como roupas, máscaras, vasos e esculturas, anteriormente apresentados como símbolos da superioridade belga, entram para o registro de produções culturais dos colonizados. Uma nova gramática é estabelecida com as devidas adjetivações. A obra de arte belga, doravante, torna-se a obra de arte congolesa no museu belga, e neste rearranjo, estranhamentos e questões podem emergir. Se os artefatos do museu são criações congolesas, não deveriam eles estar no Congo, dinamizando a vida cultural e econômica do país? Não seria a síntese da incipiente dialetização imagética do museu seu necessário fim? Lançar perguntas e pautar discussões são formas de desconcertar sentidos e horizontes temporais. Se as perspectivas sobre o passado se alteram, novos projetos de futuro podem ser compartilhados. Meus entrevistados, quando questionados, concordam que as obras do Museu Real da África Central deveriam retornar ao Congo como forma de reparação. No meu contato com este lugar de memória em transformação, imponente documento da cultura e da barbárie, bem como com os filhos e netos daqueles cujas obras foram levadas a ele, busco expressar, por meio de reflexões e imagens (registros da visita ao museu e dos encontros com os artistas) inquietações de ordem ética, psíquica e estética sobre colonialismo, traumas e reparação.
PT
Lucas de Oliveira Alves. Psicólogo; Psicanalista; Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); Doutorando em Psicologia (UFSC). Pesquisador convidado do EDIQ (Équipe de recherche en partenariat sur la diversité culturelle et l’immigration dans la région de Québec) – Université Laval. Realizou estágio de pesquisa no SAPSIR (Service d'aide psychologique spécialisée s'adressant aux réfugiés et aux immigrants) em Québec/Canadá.
EN
Lucas Oliveira Alves. Psychologist; Psychoanalyst; Master in Psychology from the Federal University of Santa Catarina (UFSC); PhD student in Psychology (UFSC). Guest researcher at EDIQ (Equipe de recherche en partenariat sur la diversité culturelle et l’immigration dans la région de Québec) – Université Laval. He completed a research internship at SAPSIR (Service d'aide psychologique spécialisée s'adressant aux réfugiés et aux immigrants) in Quebec/Canada.