Imagem e contra imagem de uma boa vista

Fabiana Bruce Silva


Palavras-chave: iconografia; território; cultura visual; boa vista; contra imagem.


Partindo de meu lugar referencial na cidade onde vivo, cujas camadas são variadas e que, até por isso, precisa-se de algum esforço para visualizá-las, proponho apresentar um recolhe de imagens do que restou em um território que traz marcas de séculos de povoamento, de cultura e tradições (Counter-Image, 2024). O recolhe perfaz alguns caminhos reais e imaginários que pretendem indicar a vida em um estuário e o papel que a cultura desempenha na elaboração dessa vista. A paisagem tem um misto de envelhecimento e esvaziamento. Anunciando o desaparecimento, junto com as árvores e as casas que vão sendo colocadas abaixo. Elas existiram por algum tempo e depois ficaram nas fotografias, em arquivos adormecidos. Mas algumas marcas estão ainda nas esquinas, no chão das ruas, nas calçadas, nas beiras das praças e dos rios, no que resta. E é preciso ir buscar nas ruas e nos arquivos, para encontrar algumas pistas da vida, da biodiversidade.

Para fundamentar essa proposta, para melhor “explorar a imagem e a visualidade no seu impacto, na construção dos nossos mundos” (Counter-Image, 2024), quando a promessa de futuro parece ter estagnado, é preciso dar a volta e contar histórias, proceder genealogias e tentar enxergar sinais do que tem por dentro de uma cidade, nas camadas contiguas e de baixo. Perguntando se seria possível ver algo a mais daquilo que se mostra nos museus, no horizonte. Perguntando ainda, que meio ambiente é este, agora? Quando a historia, ao fechar os olhos, parece estar esfriando, descolando de sua ambiência física e prevendo a chegada de um “novo mundo” que será, dizem. Entendendo que esta historia sonhada, que busca as origens e que deseja o futuro é parte importante da ocupação de um continente e do estabelecimento de uma civilização, quando se pretende uma boa vista.

Pesquisando nas noticias da cidade e na iconografia do Recife é possível encontrar imagens que “retratam as conexões entre humanos e não humanos e como essas representações influenciam as nossas identidades” (Counter-Image, 2024). No caso desta proposta, a ideia é de mostrar-se em estado de perplexidade, atenta a uma identidade visual local, situada a 56° 53’ N + 8° 03’ S. E condensando algumas visualidades perdidas no tempo efetivamente. Que, até por isso, voltam com regularidade, como portadoras de um imaginário arcaico, ao abrir gavetas de fotografia. A ideia então é potencializar, aumentar e diminuir o dispositivo do que seria uma boa vista, no tempo visual memorial. Como imagem e como contra imagem. Esclarecendo ainda que a boa vista é aqui uma forma simbólica, um sinal, e também um bairro do Recife - que está em espera, em abandono, diante dos processos de gentrificação que se anunciam.


Referências

  • CAUQUELIN, Anne. A invenção da paisagem. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
  • CASTRO, Eduardo Viveiros de. Imagens do pensamento selvagem. Em: Metafisicas canibais. Elementos para uma Antropologia Pós-Estruturalista. São Paulo: Cosac Naify, 2015.
  • LATOUR, Bruno. Cognição e visualização. Pensando com os olhos e as mãos. Terra Brasilis [Online], 4 | 2015, posto online no dia 12 fevereiro 2015, consultado o 05 dezembro 2022. URL: http://journals.openedition.org/terrabrasilis/1308 ; DOI: https://doi.org/10.4000/terrabrasilis.1308
  • LISSOVSKY, Mauricio. Rastros na paisagem: a fotografia e a proveniência dos lugares. Salvador: PósCom/UFBA, Contemporanea | comunicação e cultura - vol.09 – n.02 – agosto de 2011.
  • STENGERS, Isabelle. No tempo das catástrofes. São Paulo: Cosac Naify, 2015.


Nota Biográfica


PT
Fabiana BRUCE SILVA é historiadora e antropóloga. Professora de História Contemporânea na Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE, no Brasil, onde estuda a história da fotografia e os usos da imagem na História. Com pós doutorado no CRBC/EHESS/CAPES (2013-14), em Paris, França e na Escola de Comunicação da UFRJ (2019), no Rio de Janeiro, Brasil. Membro associada da Associação Brasileira de Historia Oral (ABHO) e da Associação de Pesquisadores Brasileiros na França (APEB). Tem publicado e colaborado na publicação de livros capítulos de livros sobre fotógrafos e a fotografia moderna no Recife e mais recentemente no livro Fotografia Brasileña (2020), pela Universidad de Salamanca, Espanha. Entre outros.


EN
Fabiana BRUCE SILVA is a historian and anthropologist. Professor of Contemporary History at the Federal Rural University of Pernambuco – UFRPE, in Brazil, where she studies the history of photography and the uses of images in History. With a postdoctoral degree at CRBC/EHESS/CAPES (2013-14), in Paris, France and at the UFRJ School of Communication (2019), in Rio de Janeiro, Brazil. She is an associate member of the Brazilian Association of Oral History (ABHO) and the Association of Brazilian Researchers in France (APEB). She has published and collaborated in the publication of book chapters about photographers and modern photography in Recife and more recently in the book Fotografia Brasileña (2020), by the University of Salamanca, Spain, and others.


GO BACK


^