Palavras-chave: Literatura; Psicanálise; Resistência; Estilo; Transmissão
A flor de Mulungu é uma flor brasileira de beleza hipnotizante, sua cor vermelha alaranjada desponta vibrante no inverno brasileiro e suas flores tem sido usadas como efeito calmante e sedativo pela medicina popular. A premiada escritora Conceição Evaristo lançou em 2023 o livro Macabéa: flor de Mulungu”, que poderíamos chamar de uma apropriação ou releitura do romance clássico escrito por Clarice Lispector em 1977 “A hora da estrela”. Em quase meio século que divide um livro de outro, podemos dizer que o Brasil tem vivido significativas transformações, passou a olhar mais para suas feridas e heranças coloniais, e o pensamento decolonial desponta em forma de narrativas contra hegemônicas. O objetivo deste trabalho é refletir acerca do conceito psicanalítico de estilo e de transmissão, a partir da releitura que Conceição faz de Clarice, apontando para a ferida brasileira com um olhar crítico que agrega também o pensamento ecológico à narrativa clariceana. “Desde quando vi e não só olhei de relance a moça Macabéa, caída e semimorta no chão, imaginei que a flor de mulungu seria para ela, ou melhor, seria ela (p.7)”. A obra de Evaristo, conta, também, com as ilustrações em uma união entre palavra e imagem para compor a narrativa. A partir de tal apropriação de narrativas utilizamos o conceito de poética da extração (2018), para avançar em nosso estudo, uma proposta metodológica de caráter psicanalítico que articula a arte da escuta com o processo de “cortar para ler”. Um processo manual de extração de palavras através do recorte, criando vazios que permitem novas composições da narrativa, construindo uma história original com as palavras restantes e possibilitando a entrada de um terceiro, o toque, na relação olhar e livro, que produz a condução da leitura a partir da experiência tátil, e que faz resistência às produções em massa, de modo que para cada página utilizada, uma nova lâmina foi produzida. Trata-se de um processo de desmontagem da narrativa, de modo que, de um detalhe, recortado, de uma poética da extração, algo único, novo e singular pode surgir. Da mesma forma, transpondo para a literatura brasileira contemporânea, A flor de Mulungo, lança luz à resistência de mulheres como Macabéa, que “não morrem e costumam ser porta-vozes de outras mulheres, iguais a elas”.
PT
Camila Backes dos Santos. Psicóloga pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Doutora em Psicologia Social e Institucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Pós-doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Diversidade Cultural e Inclusão Social da Universidade Feevale.
EN
Camila Backes dos Santos is a Psychologist graduated at the Federal University of Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brazil. PhD in Social and Institutional Psychology at the Federal University of Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brazil. Postdoctoral degree from the Postgraduate Program in Cultural Diversity and Social Inclusion at Feevale University.
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