Palavras-chave: solo, ecologia, cuidado, interdependência
Este trabalho parte de uma tese de doutorado que abordou as práticas de cuidado na Comuna Pachamama, localizada em um assentamento na zona rural do estado do Rio Grande do Sul, que se identifica enquanto anarquista e tem como uma de suas tarefas cotidianas o compartilhamento do cuidado das crianças. Através da experiência etnográfica de uma “pesquisadora-mãe” foi possível traçar uma ecologia que deflagra como o cuidado se torna possível neste espaço. Dentre essas práticas, foi possível perceber a agência do solo no campo ecológico e interdependente do cuidado, levando em consideração suas especificidades, uma vez que a Comuna carrega um histórico de tentativa e erro do campo do plantar. Lá, o solo foi analisado enquanto constituído de matéria argilosa e lençóis de água salobra, o que dificulta a prática do plantio de lavouras e hortas.
Solo, conforme aponta Isabela Noronha (2018), em diálogo com Puig de la Bellacasa (2014), cientificamente e materialmente falando, refere-se a uma camada da Terra derivada da decomposição de rochas e de restos de animais ou vegetais, composta por materiais inorgânicos e orgânicos, que pode ser tratada tanto pela sua composição química quanto enquanto uma teia de organismos vivos. Ainda, solo se refere a um objeto que demanda atenção, cuidado, preocupação para além dos círculos científicos, como de ativistas ambientalistas, agricultores ou jardineiros. Solo, ainda, é onde se pisa, onde se planta. O solo também carrega, com ele, ancestralidade, vestígios, resíduos, história. E com isso, Puig de la Bellacasa (2014) sugere que pode existir uma “lacuna” em nosso entendimento sobre o solo, lacuna esta que ela sinaliza enquanto a possibilidade de compreendê-lo enquanto uma matéria viva, ou ainda, enquanto uma “unidade relacional e a teia biodiversa da qual nós humanos fazemos parte” (Noronha, 2018). Isso não significaria dizer que, cientificamente, o solo é interpretado como uma matéria inerte, mas que o foco não tem sido sua dimensão ética ou afetiva, tampouco relação entre a humanidade e as multiespécies.
Para Puig de la Bellacasa (2014) seria necessário enxergar os humanos como membros da comunidade do solo, e não apenas enquanto consumidores ou beneficiários de um serviço. Com isso, é possível reformular a definição ecológica de solo vivo para afirmar que os humanos estão envolvidos na criação do solo, bem como se adaptam à vida dentro dele (Puig de la Bellacasa, 2014). Ao chegar a um território, a um lote de terra, não basta “apenas” colocar sementes na terra. É necessário plantar. Este ato está carregado de, além de um conhecimento, uma prática de tentativa e erro. É preciso conhecer o solo, identificar sua compactação, compreender como as raízes vão se espalhar. É necessário identificar a posição solar conforme a necessidade das plantas, assim como eleger qual a melhor época do ano/temperatura para plantar determinado alimento. Por isso, aposta-se aqui, em diálogo com Puig de la Bellacasa (2017), na ideia de solo enquanto um organismo vivo, “living soil”, assumindo que a composição de componentes presentes no solo tem interações constantes: relação humano-solo.
PT
Sou Daniela Dalbosco Dell’Aglio, estou como Pós-doutoranda do PPG Psicologia e Saúde (UFCSPA). Este pós-doutorado trata-se de um edital estratégico, o qual planejo e executo tarefas em conjunto ao PPG. Sou Doutora em Psicologia Social e Institucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2021), onde foi membro do Núcleo de Pesquisa em Sexualidade e Relações de Gênero (NUPSEX/UFRGS) e colaboradora do Centro de Referência em Direitos Humanos, Relações de Gênero, Diversidade Sexual e Raça (CRDH/UFRGS). A minha tese intitula-se “Ecologia do cuidado: práticas cotidianas e arranjos de imprevisibilidades em uma comuna rural” a qual tratou a respeito das materialidades atravessadas às redes que fazem o cuidado ser possível. Neste momento, debrucei-me nos estudos ecológicos, me aproximando de Latour, Haraway e Puig de la Bellacasa, os quais contribuíram para a compreensão de interdependência entre agentes humanos e não humanos. Meus estudos centram-se no campo epistemológico dos estudos de gênero, política e ciência feminista, feminismos e cuidado. Posteriormente a conclusão do doutorado, fui professora de uma universidade privada em Porto Alegre, cidade em que resido, por um ano e meio. Ainda possuo graduação em Psicologia pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (2012), especialização em "Instituições em Análise" pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2014) e mestrado em Psicologia Social e Institucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2016).
EN
I’m Daniela Dalbosco Dell’Aglio, I’m a Postdoctoral Fellow at PPG Psychology and Health (UFCSPA). This post-doctorate is a strategic call for proposals, in which I plan and execute tasks together with the PPG. I have a PhD in Social and Institutional Psychology from the Federal University of Rio Grande do Sul (2021), where I was a member of the Research Center on Sexuality and Gender Relations (NUPSEX/UFRGS) and a collaborator at the Reference Center for Human Rights, Gender Relations, Sexual Diversity and Race (CRDH/UFRGS). My thesis is entitled “Ecology of care: everyday practices and arrangements of unpredictability in a rural commune” which dealt with the materialities permeated by the networks that make care possible. At this time, I focused on ecological studies, approaching Latour, Haraway and Puig de la Bellacasa, who contributed to the understanding of interdependence between human and non-human agents. My studies focus on the epistemological field of gender studies, feminist politics and science, feminisms and care. After completing my doctorate, I was a professor at a private university in Porto Alegre, the city where I live, for a year and a half. I also have a degree in Psychology from the Federal University of Health Sciences of Porto Alegre (2012), a specialization in "Institutions in Analysis" from the Federal University of Rio Grande do Sul (2014) and a master's degree in Social and Institutional Psychology from the Federal University of Rio Grande do Sul (2016).