Palavras-chave: Walter Benjamin, Dominação da Natureza, Antropoceno, Progresso
A pandemia de COVID-19, crise sanitária que afetou o mundo em escala global, demandou de todos e todas a vivência de uma temporalidade distendida e diferente, em que a alta velocidade das rotinas cotidianas tiveram de ser cessadas de modo súbito, em prol da busca pela sobrevivência e da redução da transmissibilidade do vírus mortal. Diante disso, vimos melhorias na qualidade do ar provenientes das restrições da pandemia em cerca de 84% dos países, um dos fatores preocupantes para especialistas em mudanças climáticas, em função das novas ondas de calor, secas intensas, aumento do nível do mar e níveis alarmantes de poluição de diversos gêneros. Walter Benjamin, filósofo e ensaísta alemão, na décima-primeira tese sobre o conceito de história, seu escrito testamental, evocou a noção de destruição da natureza pela ânsia capitalista na direção do progresso acelerado e linear. Ele criticou o posicionamento progressista socialdemocrata de Joseph Dietzgen, cuja concepção carregava um conceito corrompido de trabalho no qual tudo estaria à serviço da humanidade, ou seja, a natureza seria reduzida a um artigo "gratuito", uma simples matéria-prima com fins industriais, um objeto de dominação e exploração ilimitado aos humanos. À contrapelo desta posição, Benjamin apelava às utopias dos primeiros socialistas e aos sonhos fantásticos de Fourier a fim de construir uma relação de outro caráter com a natureza. Esta relação estaria apartada dos ditames capitalistas e, portanto, da fetichização da natureza enquanto uma mercadoria e do ímpeto de dominação da natureza no capitalismo de uma forma predatória. Talvez Benjamin tenha nos antecipado a discussão sobre o antropoceno, debatendo de algum modo a importância da crítica ao capitalismo e sua perspectiva de progresso linear, sustentada metaforicamente como um trem acelerado que se dirige em direção ao abismo. Tal "abismo" pode bem ser a catástrofe ecológica em curso que produz, indubitavelmente, a necessária criação de modelos sociais mais justos e sustentáveis, tanto na esfera político-discursiva, quanto na esfera material. Desse modo, interrogamos: de que forma podemos, a partir do pensamento crítico e das narrativas, dar materialidade a essas concepções sustentáveis que já estavam presentes nas críticas benjaminianas ao modo de vida do capitalismo? Como seria possível "acionar" o freio de emergência na direção de um movimento de transformação social? Como trabalhar com categorias de pensamento que nos ajudem a desconstruir a lógica capitalista de dominação estrita da natureza como matéria-prima e mercadoria? A mirada do progresso veloz e linear da sociedade capitalista, que ruma a uma evolução técnico-científica, tem trazido como consequência um modo utilitarista de consumir a natureza, ou seja, uma lógica de uso e descarte. Benjamin, de forma talvez visionária, chama a nossa atenção para as ameaças futuras num movimento condicional mostrando, já na década de 1930, que resta à humanidade pensar nas condições postas a fim de lidar com a perspectiva afirmativa de um futuro para o mundo. Tal perspectiva emerge, certamente, no tratamento das mudanças climáticas, ou mesmo, como diria Benjamin, acionando o freio de emergência da locomotiva da história, permitindo então o vislumbre de um futuro porvir.
EN Luiz Felipe Soares Araujo: Psychologist. Master's student in the Postgraduate Program in Clinical Psychology from the University of São Paulo (USP). Member of NUPPEC/UFRGS-USP and PSOPOL. ORCID: http://orcid.org/0009-0001-2101-3383
EN Rose Gurski: Psychoanalyst. Member of APPOA. Associate Professor of the Department of Psychoanalysis and Psychopathology at the Federal University of Rio Grande do Sul (UFRGS); professor of the Postgraduate Program in Psychoanalysis: Clinic and Culture at UFRGS; guest professor at the Postgraduate Program in Clinical Psychology at University of São Paulo (USP). CNPq researcher. One of the coordinators of the NUPPEC – UFRGS Research Center for Psychoanalysis, Education and Culture. Postdoctoral by USP. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7392-1463
PT Luiz Felipe Soares Araujo: Psicólogo. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo (USP). Integrante do NUPPEC/UFRGS-USP e do PSOPOL. ORCID: http://orcid.org/0009-0001-2101-3383
PT Rose Gurski: Psicanalista. Membro da APPOA. Professora Associada do Departamento de Psicanálise e Psicopatologia da Universidade Federal de Rio Grande do Sul (UFRGS); professora do Programa de Pós-Graduação em Psicanálise: Clínica e Cultura da UFRGS; professora convidada do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo (USP). Pesquisadora do CNPq. Uma das coordenadoras do NUPPEC – Núcleo de Pesquisa em Psicanálise, Educação e Cultura UFRGS. Pós-doutora pela USP. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7392-1463